Meu nome é João Beraldo, e eu faço parte de uma espécie em extinção no Brasil.
Tá, meio dramático, mas, continue lendo. Você vai entender onde eu quero chegar.
Tenho 36 anos, já a meio caminho dos 37. Fiz meu primeiro jogo aos 12 anos, quando era estagiário de uma empresa de software. Quando me mandaram testar um sistema de documentos vinculados (imagine a Wikipedia offline em 1991), fiz um jogo no estilo livro-jogo em que, dependendo do personagem que você escolhia, tinha escolhas e cenas diferentes.
Inventei de ser game designer e escritor de verdade por volta do ano 2001 quanto quis fazer meu próprio space sim. Comecei por baixo: tive uma ideia para um RPG via mIRC usando um software de mapeamento e combate como suporte. Wing Commander: Frontier teve por volta de 35 jogadores de 10 países diferentes. Pra mim era o maior sucesso.
As brincadeiras tomaram um caminho mais sério quando, meses depois, juntei-me a 5 amigos para fazer um space sim 3D chamado Border Wars (cujo vídeo de techdemo está abaixo). Era o jogo dos meus sonhos tomando forma.
Não éramos os únicos caras no Brasil fazendo jogos nessa época, claro. Mas a falta de redes sociais e de conteúdo online fazia com que cada experiência fosse isolada e única. Era tão raro que entre 2002 e 2004 chegamos a ser chamados para dar palestras em eventos na UFRJ e UERJ, e também em uma das primeiras SBGames (acho que em Salvador? Não pude ir).
Eram tempos bizarros, de achômetro, que, imagino eu, tinham muito a ver com os anos 70 nos EUA, em que se fazia muito na garagem, no tempo livre.
Só anos depois fui conhecer pessoas como Daniel Garcia, Fernando Chamis, Winston Petty, Marcelo Carvalho e Christopher Kastensmidt. Se você não conhece esses nomes, sugiro pesquisar. Talvez você se surpreenda.
O tempo passou. O programador e, depois, eu, fomos contratados por uma empresa grande que surgira “do nada” com seu próprio space sim, um MMO. Border Wars nunca ficou pronto e daquele grupo seguiu cada um seu caminho, metade ainda na indústria, a outra em outras áreas. Vieram outros empregos, outros jogos. Vieram os MMOs. Vieram os jogos sociais. Vieram os jogos de smartphones e tablets. Vieram os serious games e jogos educacionais.
A cada ciclo surgiram novas coisas a aprender, novas oportunidades de trabalho.
O problema é que o tempo passa, as coisas mudam, mas não o suficiente.
Quase 15 anos depois que comecei, praticamente não existem vagas para game designers no Brasil.
OK, existem, se você for estagiário e tiver sorte, ou se tiver experiência e contatos no ramo. Mas o Game Designer novato pode (e deve) aceitar riscos que o Game Designer de meia idade não pode (e não deve).
Em 2007 me mudei com mala e cuia para Florianópolis para trabalhar em jogo. Em 2011, vim para São Paulo para trabalhar em jogo. Hoje recusei me mudar para o Rio (onde eu nasci e cresci).
O Game Designer de meia idade é marido e pai, e mudar fica complicado.
O Game Designer de meia idade também tem custos maiores e precisa de um salário maior, que a maioria das empresas não pode paga. Isso quando sequer cogitam contratar um game designer, por mais júnior que seja.
Este ano, quando fui ao BIG Festival, tive um choque de realidade: não conhecia praticamente ninguém lá. Certo, existem os caras que conheço de Facebook, cujos nomes começaram a ficar conhecidos na indústria. Mas... cadê todo mundo? Cadê as literalmente centenas de pessoas com quem trabalhei ao longo desses anos todos?
Foi aí que a ficha caiu.
Para o Game Designer de meia idade existem apenas 4 escolhas:
- Abandonar a indústria;
- Mudar para outro país;
- Tornar-se professor;
- Abrir sua própria empresa.
Não, eu não vou abandonar a indústria. Se depender de mim, nunca.
Não vou mudar de país. Já recebi propostas, mas hoje são tão indesejáveis quanto uma mudança de São Paulo para o Rio.
Não tenho jeito para dar aulas. Já trabalhei muito como tutor de game designers juniores, e acho que até fiz um bom trabalho, mas sala de aula não é pra mim.
Ouço quase que diariamente que abrir uma empresa é furada, em especial de metade dos caras que listei ali em cima. E, vamos ser realistas: abrir uma empresa significa trabalho que vai te impedir de fazer game design. Não é o que eu quero.
Que alternativa tenho eu, então, se me recuso a aceitar essas 4 escolhas?
Criar minha própria.
Segunda-feira recusei o emprego no Rio, depois fui a empresa para quem prestava consultoria de GD e me desliguei da mesma. Encerrei meu contrato de freela com um estúdio indie nos EUA.
Contratei um ilustrador freelancer.
Comecei a fazer meu próprio jogo.
Talvez eu seja maluco. Fazer meu próprio jogo não dá dinheiro (custa, na verdade), nem dá estabilidade. Mas me mantém em casa com minha família e, talvez mais importante para o Game Designer de meia idade, permite que eu faça o jogo que EU QUERO.
Quase 9 anos exclusivamente na indústria, e sempre fiz o jogo dos outros.
Agora é a minha vez.
Até porque, se não fizer agora, não faço nunca.
Não sou totalmente louco. Aprendi muito e sei definir escopos viáveis. E os anos de suor e lágrimas me deram a possibilidade de viver um bom tempo sem precisar de um emprego ou freelas. A Game Designer de meia idade tem reservas, e tem uma esposa compreensível que, depois de anos seguindo o marido, hoje está numa posição financeira melhor e mais estável. Se é que estabilidade é algo viável na indústria de jogos brasileira.
Eu vou fazer esse jogo.
Eu vou colocá-lo na rua até o final de 2015.
E vai valer a pena.
Só para provar que as coisas estão andando, fica aí uma concept art.
Vejo vocês em breve.
Sucesso pra ti! Vai conseguir sim!
ResponderExcluir\o/ genki dama de energia positiva para vc bro! Sucesso!
ResponderExcluirTudo de bom cara!!!!
ResponderExcluirTenho exatamente a sua idade, sobre a vida pessoal acho que a palavra de ordem é FLEXIBILIDADE, ou nos adaptamos sem perder a essência ou viramos dinossauros, lembra de Bruce Lee? Seja como a água, my friend!
ResponderExcluirSobre o jogo acho que chegou a sua hora, melhor fazer do que conviver com a culpa de não ter tentado, vai dar certo!
Abs de um amigo!