Marcadores

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Resenha: Alquimia da Pedra - Ekaterina Sedia (editora Tarja)

Resolvi começar as postagens sobre Literatura com a resenha de um romance que li há pouco tempo, Alquimia da Pedra, da autora russa Ekaterina Sedia.

Já tinha ouvido falar da Ekaterina havia algum tempo, mas nunca tinha lido nada dela. Alchemy of Stone (no original) tinha me chamado atenção por ser descrito como um romance new weird. O new weird é algo como uma mistura de fantasia, ficção científica e terror, e é bem conhecido através de autores como Jeff Vandermeer (da série sobre a cidade de Ambergriss) e China Miéville (da série sobre o mundo de Bas-lag). No geral são histórias urbanas passadas em um mundo de fantasia mais avançado do que o clássico pseudo-medieval, onde máquinas e magia vivem em conjunto.

Esbarrei com a versão brasileira do romance (publicado pela editora Tarja) durante uma das Bagunças Literárias organizadas pelas editoras ‘indie’ Tarja, Draco, Estronho entre outras. Ando bastante interessado no New Weird, até porque estou na (espero eu) última revisão do meu próprio livro New Weird antes de enviá-lo para o editor (um dia falo mais sobre isso). Bom, resolvi comprar.

Alquimia da Pedra é descrito na Wikipedia (en inglês) como um “romance steampunk sobre sexismo e conflito de classes”. Paradoxalmente o sexismo foi o ponto forte e fraco do livro. Calma! Vou explicar.

A história se passa em Ayona, uma cidade em início da revolução industrial, onde duas organizações (quase como partidos políticos) lutam pelo controle do governo: os Mecânicos e os Alquimista. A cidade mistura elementos de fantasia e ficção na forma da presença de autômatos, alquimistas criando poções e homunculos, enormes lagartas mecânicas que funcionam como transporte e a guarda da cidade, que mais parecem robôs armados com mosquetes e montados em lagartos gigantes. Além disso existe a história da própria cidade, construída por gárgulas, criaturas que hoje vivem às margens da sociedade e que vem aos poucos se transformando em pedra.

A história é contada pelo ponto de vista de Mattie, uma autômata emancipada por seu criador Loharrin, membro importante dos Mecânicos. Mattie acabou por treinar e se tornar um alquimista, não por questões políticas, mas por puro maravilhamento com essa arte. Quando a história começa, Mattie recebe uma visita das gárgulas, que desejam que Mattie descubra uma cura para a condição que os transforma em pedra. A história segue essa busca, mas envolve diversos outros elementos, em especial a mudança da cidade na medida em que os Mecânicos solidificam seu poder, o conflito de classes que logo fica bem quente com uma série de atentados violentos e, claro, a relação entre Mattie e os diversos humanos que encontra.

Mattie é uma personagem interessante. O simples fato de ser um autômato alquimista já é um conflito chave na história. Ao mesmo tempo, por ser autômato (e parecer uma mulher?) ela é tratada como objeto por todos os homens com quem encontra, exatamente o que a torna ótima como os olhos da história, pois está sempre presente nos grandes eventos. Mattie se comporta quase como uma criança quando se relaciona com outras pessoas, especialmente as que a tratam bem. Ela simplesmente não sabe bem como se comportar e o que é esperado dela. E, agora, chegamos ao que eu queria dizer sobre o problema do sexismo.

Não sei dizer se foi proposital ou não, mas Mattie é o tipo de personagem que você acaba ficando com ódio. Mattie raramente age. Ela geralmente está sendo levada pelos acontecimentos e pelos outros personagens. Até mesmo quando ela age parece uma coisa meio fraca, quase sem querer. Mattie é extremamente submissa, especialmente em relação ao seu criador Loharri, com quem tem uma relação quase como marido agressivo e mulher submissa. Enquanto no fundo ela (às vezes) reclama do tratamento, nunca faz nada a respeito. Simplesmente obedece.



Agora, você pode falar “Mas, pô, não é exatamente esse o ponto? Criticar o tratamento recebido por mulheres comparando-a a um robô que apenas reage e jamais expõe seus pensamentos?” Acho que sim e certamente isso é um ponto forte para quem conseguir ler além das palavras do livro. Realmente o assunto foi muito bem abordado. Mas, paradoxalmente (ou não), isso me deu uma sensação ruim sobre o romance. Você começa sentindo pena da Mattie, depois raiva. Minha filha, faz alguma coisa! Mas, não.

O livro vale a pena? Vale. Não acho que a personagem seja ruim ou mal escrita. Como disse, ela passa muito bem a mensagem da autora, mesmo que você acabe com raiva de Mattie. Existem alguns (poucos) deslizes na tradução e digitação, mas longe de ser um impeditivo para a leitura.

Se você gosta de fantasia, mas não aguenta mais o padrão, ou se gosta de ficção sobre assuntos sociais e políticos, esse livro é para você. E depois me conte sua percepção sobre Mattie!

Links:
Site da autora - http://ekaterinasedia.com/

Nenhum comentário:

Postar um comentário